Caminhar pel(es) pedras
Museu das Bandeiras.
Cidade de Goiás (GO).
2024.
Foto: Alexandre L Santos e Beatriz da Terra
César Becker | Curador
Léa Juliana é uma escultora que se dedica a esculpir/coletar pedras a partir de percursos estabelecidos no entorno do Distrito Federal e Goiás. A artista segue os rastros de trilhas muito antigas, de bilhões de anos atrás. Cada pedra coletada tem registrada em sua superfície aquilo que se destinou a transformar no que conhecemos hoje como o Planalto Central Brasileiro.
Quando afirmo que Léa Juliana esculpe as pedras, não se trata da escultura determinada por intermédio do cinzel e do martelo. Pensar nas obras da artista como escultura é elaborar a respeito do que é a pedra ela-mesma – naquilo que lhe é própria.
Juliana estabeleceu um método próprio de retirada de finas camadas da superfície mineral, as Peles de pedra. Diante deste processo subtrativo, a artista nos faz reconhecer cada fresta, ângulo e aresta provenientes dos choques, das intempéries, dos percalços e acidentes de percurso que fizeram, em princípio, estas pedras tomarem forma.
A artista nos apresenta a memória do trabalho incessante dos relevos; elevações de massas de terra lavrada e trabalhada até a menor partícula rochosa. Léa compreende a memória como uma qualidade própria da matéria e se ocupa de apresenta-la como uma aposta estética e conceitual da obra elaborada.
Apresentar algo é proporcionar espaço para que a coisa se manifeste. Isso se assemelha a fazer escultura, em seus termos mais tradicionais: gravar, cinzelar, retirar, cortar, escavar, ou seja, abrir espaços para tornar a forma visível.
Portanto, as ferramentas utilizadas pela artista são usadas para evidenciar traços, caminhos e percursos. Seu próprio corpo é como uma ferramenta que grava impressões: pisa sobre o Cerrado, deposita seu peso sobre o lugar como quem posiciona o cinzel e o malho sobre a pedra.
Léa Juliana caminha pelas pedras como quem esculpe o percurso dos seus próprios passos. Recolhe e busca nas pedras, como lembra João Cabral de Melo Neto, a sua “pedra de nascença”, aquela que carrega sempre consigo, pedra entranhada na alma.









